Desesperança

Acabei de ver na televisão uma criança do Complexo do Alemão responder à pergunta "O que você quer ser quando crescer, Ronaldo?" com "Trabalhador." Faça essa pergunta às crianças da classe média e ninguém responderá assim. Seus sonhos vão de foguete, passam por holofotes, política, justiça, escola... "O que você quer ser quando crescer?" é na verdade sinônimo de "Que trabalhador você quer ser?"
Para Ronaldo, que mora em uma região na qual a renda per capita é de R$177, essa pergunta passa por 3 etapas: é preciso sobreviver até lá, escolher não se juntar aos criminosos e ter a sorte de ter um emprego. É difícil planejar além daí, até porque Ronaldo provavelmente não sabe muitos nomes de empregos. Os adultos a sua volta dificilmente saberão responder com o que trabalham, já que fazem, basicamente, o que for preciso. Além disso, não faz parte dessas comunidades partilhar experiências, contar casos, ouvir crianças, inspirá-las.
Se a invasão não chegar trazendo um papo, um livro, um filme, um passeio, Ronaldo não conseguirá mesmo ir além. No dia de festa e luto de hoje, o menino nos deixa a lição de que até a sonhar se aprende...



Em tempo: é claro que a resposta foi tratada pelo repórter como muito natural, um exemplo de criança que já entendeu a mudança na estrutura da favela, o valor do ganha-pão honesto. Mas criticar a imprensa brasileira é tão fácil que se torna banal demais...